AOS 88 ANOS, A MORTE TRANQUILA DE HENRY MILLER
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Publicado
na Folha de S.Paulo, segunda-feira, 9 de junho de 1980
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O escritor norte-americano Henry Miller, autor entre outros livros
da trilogia "Nexus", "Sexus" e "Plexus",
morreu anteontem à noite, em sua residência na Califórnia,
aos 88 anos de idade.
A informação sobre o falecimento do escritor somente
foi divulgada ontem pelo seu editor, Noel Young, o qual afirmou que
"ele morreu calmamente nos braços de seu mordomo. Estava
sofrendo de arteriosclerose e era velho demais para ser submetido
a qualquer tratamento".
Miller, filho de um alfaiate alemão, foi um dos escritores
norte-americanos mais controvertidos e seus livros, considerados malditos,
somente foram liberados pela censura e publicados nos Estados Unidos
em 1961.
Pacific
Palisades, Califórnia - Henry Miller, o controvertido
autor, cujas primeiras novelas foram proibidas nos Estados Unidos
durante quase 30 anos, morreu anteontem aos 88 anos de idade, em
sua residência, informou ontem o seu editor.
Noel Young, editor da Capra Books, em Santa Bárbara, disse
que Miller sofria de problemas circulatórios há muito
tempo.
"Trópico de Câncer" e "Trópico
de Capricórnio", as primeiras obras de Miller, escandalizaram
os leitores com suas detalhadas narrações sobre sexo.
Quando "Trópico de Câncer" apareceu pela
primeira vez em Paris em 1934 o poeta Ezra Pound comentou: "Por
fim, um livro obsceno digno de ser lido".
Nascido em Nova Iorque, Miller viveu a decada de 1930 em Paris,
onde travou amizade com muitos norte-americanos expatriados e artistas
europeus, como Anais Nin e James Joyce.
O escritor regressou aos Estados Unidos em 1940.
Seus livros combinam descrições sexuais, conjecturas
filosóficas e pensamentos sobre a literatura e a sociedade,
e ocasionalmente têm um caráter surrealista e autobiográfico.
Miller se casou cinco vezes e teve três filhos.
Foi condecorado com a Legião de Honra da França em
1975 e incorporado ao Instituto Nacional de Artes e Letras.
"O Colosso de Maroussi", livro de viagens pela Grécia
publicado em 1941, é considerado por alguns criticos como
sua melhor obra. Entre outras, escreveu "Sexus", "Plexus",
"Nexus", "O Grande Sul ou as Laranjas de Hieronymus
Bosch" e "A Odisséia do Artista Criador nos Estados
Unidos da América do Norte".
Várias de suas obras foram publicadas em castelhano há
mais de duas décadas por uma editora argentina.
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Primeira
obra só liberada em 61 |
Paris - Autor maldito, perseguido pela pobreza e proibido em
seu próprio país por obscenidade, o escritor norte-americano
Henry Miller, que morreu anteontem na Califórnia, recentemente
pôde desfrutar da glória, quando já estava com
quase 70 anos, em 1961, momento em que, nos Estados Unidos, foi levantada
a censura que pesava contra sua obra.
A partir desse momento, seus livros encontraram em todo o mundo um
profundo eco. Os beatniks e posteriormente os hippies se reconheceram
nas idéias anarquistas que expressou, às vezes de modo
confuso, em cada um de seus livros, nos quais o elemento autobiográfico,
quase sempre, constituiu o corpo e a alma de sua escritura.
Nascido no Brooklyn, em Nova York, em 1891, Miller conheceu paradoxalmente,
durante toda sua juventude, a atmosfera alemã do bairro de
sua infância, e foi este microcosmo cultural e linguístico
que, a principio, quis "escarrar", como dizia, antes de
se lançar por inteiro contra a sociedade norte-americana que
odiou possivelmente até o último instante de sua vida.
Sua rebelião de menino foi rapidamente alimentada por suas
leituras desordenadas, como acontece com todo autodidata, que no entanto
pouco a pouco se concentraram sobre os escritores que representavam
na época a tradição européia de subversão
espiritual: Rimbaud, Strindberg, Dostoievsky.
Miller, vagabundo, escritor em projeto, se lançou à
aventura de Paris dos anos trinta, sem um centavo no bolso, sem poder
escrever, buscando desesperadamente um pouco de comida, um pedaço
de pão, e podendo por fim, aos 42 anos, escrever seu primeiro
livro sobre sua própria experiência parisiense: "Trópico
de Câncer", que explodiu como uma bomba no universo dos
iniciados que então pululavam na capital francesa.
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Com
uma prostituta |
Miller em Paris, vivendo em Montparnasse com uma prostituta pobre,
alimentado de vez em quando por amigos ou mecenas, insistiu sempre
na diferença existente entre obscenidade e pornografia, este
último termo com o qual imediatamente foi qualificado seu primeiro
livro.
Este rótulo ficou durante longuíssimos anos vinculado
a seu nome, e seus livros "Trópico de Capricórnio",
assim como sua trilogia "Nexus", "Sexus" e "Plexus",
contribuíram para que suas obras ficassem sob censura em quase
todos os países.
Miller sustentou sempre a opinião de que tudo deve ser dito,
e que graças a isto é que os escritores podem abordar
sem problemas os temas antes proibidos.
"Sou um enamorado da vida, de todas as coisas da vida",
dizia Miller antes da guerra.
Quando regressou aos Estados Unidos em 1940, depois de uma permanência
na ilha grega de Corfu, que lhe inspirou o livro "O Colosso de
Maroussi" continuou a viver na pobreza, e foram os soldados norte-americanos
na Europa que descobriram entusiasmados, nas edições
publicadas em inglês em Paris, a existência deste escritor
desconhecido em seu país.
Com efeito, poucas vezes um escritor encontrou tantas resistências
à sua obra, como as que teve de enfrentar Miller.
Proibido até 1961 nos Estados Unidos e até 1963 na Grã-Bretanha,
em todo o mundo a publicação de suas obras provocou
frequentemente protestos, cóleras e recursos a tribunais. Porém,
progressivamente os malentendidos se foram dissipando, e se começou
a julgar o escritor não a partir de algumas passagens dificilmente
suportáveis de seus escritos, mas de acordo com a totalidade
de uma obra que a partir desse momento já era considerável.
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