Bernardo Ajzenberg
Marcelo era esperto e adorava jogar futebol. Mas ele não
tinha camisa de nenhum time. Para jogar bola, Marcelo vestia camisetas
de basquete.
Ele fazia isso porque o pai dele, chamado Teodoro, era fanático
por bola-ao-cesto e só dava de presente para Marcelo camisetas
de basquete.
Essa era uma mania do seu Teodoro. Queria a todo o custo que o filho
fosse, um dia, o cestinha de alguma equipe famosa de bola-ao-cesto.
Ele dizia para Marcelo:
Basquete faz a gente crescer muito, muito, meu filho. E é
mais bonito que futebol.
Mas Marcelo achava o futebol mais bonito do que o basquete. Falava
para todo mundo também que nem queria crescer muito.
Quero ser do tamanho do meu pai, só isso dizia
Marcelo. E seu Teodoro não era lá muito alto. Era
normal.
O maior sonho de Marcelo era ter uma camisa oficial da seleção
brasileira de futebol.
Marcelo tinha um amigo, o Plínio, que morava dois andares
acima do apartamento dele, no mesmo prédio. Plínio
fazia judô num clube e usava nas lutas um quimono fininho
mais parecia pijama.
Ele também tinha um sonho: vestir nas lutas um quimono de
pano grosso, muito costurado, um quimono pesado e tão resistente
que nem um leão pudesse rasgar.
O pai de Plínio, seu Hamílton, gostava de ver o filho
lutando judô. Mas preferia que Plínio fizesse um outro
esporte, o handebol. Por isso não queria dar para Plínio
um quimono novo de tecido grosso e resistente. A mania do seu Hamílton
era dar bolas de handebol a Plínio no Dia da Criança.
Todo ano fazia o mesmo. Plínio tinha quatro bolas de handebol!
Certo dia, Marcelo e Plínio se encontraram na festinha de
São João no salão do prédio. Os dois
usavam chapéus de palha. Tinham pintado bigode no rosto e
vestiam camisa de flanela xadrez. Conversaram bastante. Comeram
pamonha, cocada, pé-de-moleque. Tomaram refrigerantes e se
divertiram muito.
Na hora de dançar a quadrilha, eles conheceram uma nova moradora
do prédio, chamada Roseli. Era uma menina de cabelos pretos,
lisos e compridos, presos num rabo-de-cavalo com uma fita vermelha.
Roseli tinha a mesma idade deles, quer dizer, 8 anos. Usava um vestido
xadrez vermelho-e-branco.
No finalzinho da festa, depois da dança da quadrilha, pais
e mães ficaram conversando, e as três crianças
se sentaram perto do escorregador que havia no jardim.
Plínio e Marcelo contaram a Roseli que estavam chateados.
Meu pai só quer saber de basquete, mas eu gosto é
de futebol disse Marcelo.
O meu só quer saber de handebol, e eu prefiro lutar
judô completou Plínio.
Foi aí que Roseli disse para eles a sua idéia:
Por que você não começa a lutar judô,
e o Plínio começa a jogar futebol num clube?
Plínio ficou ressabiado, torceu a boca e perguntou:
E daí? O que você acha que vai acontecer se
a gente fizer essa troca? Os nossos pais nem vão deixar.
Roseli deu um sorriso. Depois, respondeu:
Ora, os pais de vocês vão ficar confusos...
Como assim, Roseli? quis saber Marcelo.
A menina, então, explicou o seu plano, cochichando no ouvido
de cada um.
Os dois meninos acharam que o plano de Roseli poderia mesmo dar
certo. Ficaram contentes. O problema é que precisavam de
um quimono para o Marcelo, pois o de Plínio ficava apertado
nele.
A gente pega um molde e faz um quimono de papel sugeriu
a menina.
Na semana seguinte, Marcelo pediu a seu Teodoro que o levasse a
um treino de judô.
Já que eu gosto de futebol e você de basquete
disse Marcelo para o pai, não vou fazer nem uma
coisa nem outra. Vou fazer judô.
Mas você não tem quimono, filho.
Pode deixar, pai disse Marcelo, todo contente.
Eu arrumo um quimono.
Naquele mesmo dia, Plínio pediu ao pai que o levasse a um
clube para jogar futebol.
Você quer que eu faça handebol, não é,
pai? Eu prefiro judô. Então, vou jogar futebol. Assim
a gente fica em paz!
Como Roseli havia previsto, seu Hamílton e seu Teodoro ficaram
confusos. Conversaram no mesmo dia, pelo telefone, e entenderam
que os filhos tinham feito um combinado: a troca dos esportes, só
para ver como eles reagiriam.
Em vez de ficarem bravos, os adultos acharam engraçado o
estratagema dos garotos.
Logo depois dessa conversa, os pais procuraram os filhos e disseram
a eles que tinham entendido tudo. Plínio poderia lutar judô
o quanto quisesse e ganharia um quimono.
Marcelo recebeu do pai um pacote e, quando abriu, viu que havia
dentro uma camiseta da seleção de futebol, com o número
10 nas costas!
Cheios de alegria, os meninos se abraçaram e foram juntos
ao apartamento de Roseli, que tinha acabado de tomar banho e estava
muito cheirosa. Ela ficou feliz depois que eles contaram que o plano
dela tinha dado certo e que agora cada um ia fazer o esporte que
queria mesmo fazer.
Marcelo tirou de um saquinho plástico um tubo de cartolina
branca e o desenrolou em cima da mesa da sala.
Esse é o meu quimono de papel, Roseli. Nem precisamos
dele. Fica de presente para você. Os três se abraçaram
forte, como só os verdadeiros amigos se abraçam.
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