155 MIL PESSOAS INAUGURAM O METRÔ


Publicado na Folha de S.Paulo, sábado, 27 de setembro de 1975


Exatamente 155.277 pessoas viajaram ontem no primeiro dia de abertura ao público da linha Norte-Sul do Metrô, surpreendendo os diretores da Companhia, que esperavam movimento em torno de cem mil pessoas. Nos últimos meses, o fluxo de passageiros no trecho entre as estações Liberdade e Jabaquara, que já funcionava em operação comercial, oscilava em torno de 56 mil passageiros diariamente.
O primeiro trem a deixar a estação Jabaquara, partiu pontualmente às 6 horas e Balbino José dos Santos, que chagara antes da abertura da estação ao público, foi o primeiro passageiro a entrar na plataforma. Em Santana, o trem partiu às 6h05 e Cláudio Doce Alves, um comerciante que tem uma charutaria no centro, foi o primeiro a chegar, exatamente às 5 horas, apesar do frio (a temperatura era de 8 graus).
Como se esperava, a estação São Bento, por ser a mais central, teve o maior movimento. Por seus bloqueios, passaram 32.474 pessoas. A seguir vieram as estações Santana (23.854 pessoas), Liberdade (14.852) e Jabaquara (14.394 pessoas). Hoje e amanhã o Metrô funciona normalmente, no mesmo período entre 6 e 20h30.
E, apesar do prefeito haver afirmado que não haveria festas, nem discursos, uma surpresa: a Secretaria de Turismo da Prefeitura contratou 11 bandas de música colocadas em algumas estações e distribuiu 2 mil bandeirinhas.
Projeções de estimativas e uma pesquisa de campo, realizada em 1968, deram aos técnicos do Metrô condições para estabelecer uma meta para o fim do primeiro semestre de 1976: o transporte de um milhão de passageiros por dia.
Mas esse número não é considerado, pela administração da Companhia do Metropolitano de São Paulo, como meta específica: os cálculos e as projeções estatísticas não são absolutamente perfeitos, e deixam uma faixa de possibilidades para qualquer número.

De Norte a Sul, o primeiro dia no Metrô

Exatamente 155.277 pessoas viajaram no Metrô no dia de ontem, abertura ao público de toda a linha Norte-Sul. Como se esperava, a estação São Bento foi a que teve maior movimento. Por seus bloqueios, passaram 32.474 pessoas. A seguir vieram as estações. Santana (23.854 pessoas), Liberdade (14.852 pessoas) e Jabaquara (14.394 pessoas).
Os números surpreenderam a diretoria da Companhia do Metropolitano, pois nos últimos meses, o movimento diário do trecho, entre Jabaquara e Liberdade, que já estava aberto ao público, oscilava em torno de 56 mil passageiros.
Até 15 horas de ontem, os trens do Metrô havia transportado 89.9994 passageiros. O engenheiro Plínio Assmann, presidente da Companhia do Metropolitano, mostrava-se satisfeito com o funcionamento do sistema.
"O público e os funcionários da Companhia tiveram um comportamento exemplar. Eu me congratulo com todos. Valeu a pena o sacrifício".
O público recebeu o Metrô com entusiasmo e achava que caiu durante a parte do dia de ontem contribuiu para que as estações apresentassem grande movimento. Hoje é amanhã os trens correm entre 6 horas e 20h30.

A festa que não ia haver

Apesar do prefeito Olavo Setúbal ter anunciado que na abertura da linha Norte-Sul do Metrô não havia festas e nem discursos, a Secretaria Municipal de Turismo, através de um dos assessores do secretário, admitiu ontem que coordenou o comparecimento de 11 bandas de músicas em todas as estações do setor Norte da linha e em algumas do setor Sul, além da distribuição de 2 mil bandeirinhas.
Assim, graças às providências do Turismo, houve uma inesperada festa. Um assessor de imprensa dizia que a iniciativa não havia partido do Metrô. E acentuava:
"O que se sabe por aqui é que as bandas tocaram por ordem do sr. Cláudio Lembo", secretário municipal dos Negócios Extraordinários e presidente da Arena em São Paulo.
Roque Papacardo, assessor da Secretária de Turismo, tentava justificar as providências :
"Não instalamos nem alto-falantes e muito menos palanques, que igualmente seriam componentes de rotina de qualquer solenidade, se não fosse a determinação do prefeito".
Pelo menos em relação aos discursos, a ordem do prefeito foi cumprida. Às 8h15, os funcionários do Metrô ainda limpavam o largo São Bento e a banda da Policia Militar tocava, quando Setúbal chegou. Ele esperou dez minutos pelo governador Paulo Egidio e, nesse intervalo, aproveitou para dar entrevistas.
Aquela mesma hora, em outras dez estações, as bandas de música já haviam tomado posição e tocavam suas marchas. E no largo São Bento as bandeirinhas distribuídas eram agitadas por moradores e populares.
Às 8h25, chegou o governador Paulo Egidio. Antes de tomarem o trem (acompanhados dos secretários municipais) Egidio e Setúbal passearam com sua comitiva pelo largo São Bento. O prefeito sorridente, afirmou que "o Metrô é um marco fundamental no transporte de massa, maior problema que a cidade enfrenta".
Às 8h45 a comitiva chegou à plataforma, descendo pelas escadas fixas, pois os passageiros tomavam totalmente as escadas rolantes.
Durante a viagem, Egidio e Setúbal deram novas entrevistas. O prefeito confirmou entre outras coisas que, dentro de seis meses, o traçado da terceira linha (Sudeste-sudoeste) ligará Pinheiros ao ABC será divulgado. E o governador enfatizou:
"Isso não é uma promessa, mesmo porque não é hora para falar sobre isso".
Mas, apesar da afirmativa, disse também que, se depender exclusivamente dele, o leito ferroviário será usado para a construção da terceira linha.
Às 9 horas, os visitantes desembarcaram em Santana. O prefeito pareceu muito surpreendido pela música que vinha do lado de fora, onde duas bandas tocavam. Ninguém conseguiu responder de onde seguiram as bandas. À televisão, o prefeito dizia:
"O sacrifico já passou...".
quando a comitiva chegou à av. Cruzeiro do Sul, uma das duas bandas contratadas começou a tocar mais forte. Era um ruidoso "Parabéns a Você", seguido do Hino do Corintians (o governador Paulo Egidio se confessa corintiano).
A festa não anunciada estava quase no fim. Antes de deixar Santana, o prefeito foi abordado por um popular:
"O senhor é corintiano?"
"Não. Sou sãopaulino"- respondeu Setúbal.
À tarde o ex-governador Laudo Natel e o ex-prefeito Miguel Colasuonno, por volta de 15 horas, também foram andar de metrô. Laudo pagou as passagens, e a viagem começou no terminal de Santana. Reconhecidos, eles conversaram com os passageiros.
E a DPZ, agência que produziu e veiculou a campanha publicitária do Metrô, não se responsabilizava por uma escola de samba que esteve pela manhã, na estação Jabaquara. Um dos assessores da DPZ lembrava que a agência se limitou a preparar a campanha publicitária. E informava:
"Fizemos um filme para a televisão, mas reunimos vários componentes de várias escolas, principalmente aqueles que ainda possuem as fantasias usadas no desfile de carnaval deste ano. Não conseguimos encontrar nenhuma escola com uniforme completo".

Como conseguir 1 milhão de passageiros?

Transportar um milhão de passageiros por dia é a meta estabelecida pelo prefeito Olavo Setúbal, para o Metrô cumprir até o final do primeiro semestre de 1976. Como a Companhia do Metropolitano chegou a esse número nos reduzidos limites - 16,9 quilômetros - da linha Norte-Sul?
Os técnicos da Companhia partiram de projeções de estimativas e de uma pesquisa de campo. O número de um milhão de passageiros, porém, não é considerado por eles uma meta especifica. Os cálculos e as projeções estatísticas são imprecisos e têm uma faixa de possibilidade onde qualquer número pode, na prática, surgir da realidade. Essa faixa fica entre 900 mil e 1 milhão e 200 mil passageiros. Assim, o número de um milhão foi selecionado como uma média entre essas duas possibilidades extremas e fixado como o objetivo que se procura atingir.
No entanto, mesmo a margem entre 900 mil e 1 milhão e 200 mil não é considerada segura pelo técnicos. O funcionamento da linha Norte-Sul pode abranger vinte por cento a menos ou vinte por cento a mais desses limites.
É possivel por exemplo, que a quantidade de passageiros do Metrô por dia nessa linha venha a ser de 720 mil, isto é, vinte por cento a menos que a menor margem oficialmente considerada, 900 mil passageiros por dia. Ou então que venha a ser de 1 milhão de 440 mil, vinte por cento a mais que a maior margem oficialmente considerada, 1 milhão e 200 mil passageiros por dia.
A rigor, a pergunta não é propriamente como o Metrô chegou à meta de transportar um milhão de pessoas, mas como chegou à meta de transportar alguma quantidade de pessoas nesse amplo leque que vai de 720 a 1 milhão e 440 mil possíveis passageiros.
Os técnicos da Companhia explicam que esses números surgem de uma pesquisa de origem e destino, que consideram a base de qualquer sistema de implantação de linhas de transporte coletivo. Essa pesquisa foi realizada na Capital em 1968, e seus resultados foram projetados para duas datas futuras.
A primeira projeção foi feita para 1975, porque neste ano se espera iniciar a operação comercial da linha pioneira do Metrô; a segunda, para 1990, porque nesse ano se espera ter um conjunto de linhas que atenta satisfatoriamente à população de São Paulo.
Na pesquisa de origem e destino, feita em 1968 pelo Grupo Executivo, Metropolitano (GEM), um mapa da Capital foi dividido em 218 regiões, tendo como critério informações sócio-econômicas. Dessas regiões foram escolhidas - por sorteio - aproximadamente 160 mil residencias, o equivalente a um por cento da população paulistana, cujos moradores foram entrevistados.
Basicamente, os pesquisadores procuravam saber tudo o que essas pessoas fizeram no dia anterior: para onde se locomoveram, que veiculos utilizaram, em que horário saíram de um ponto para outro, que motivos os moviam.
As entrevistas também registravam outras informações, como o nível sócio-econômico das pessoas, a partir de alguns dados principais, como a propriedade de automóvel e a população ativa. Quando uma pesquisa de origem e destino é bem feita, calcula-se que sua margem de acerto é superior a noventa por cento. Os técnicos da Companhia do Metropolitano não consideram que a pesquisa de 1968 tenha sido bem feita. Sua margem de acerto eles preferem não indicar, porque ainda não montaram todas as peças do quebra-cabeças.
Realizada a pesquisa, a Companhia partiu para o segundo passo: utilizando outro mapa da cidade, seus técnicos simularam a rede de linhas de ônibus existente. Todas as separações e junções dessas linhas foram assinaladas com pontos, que quase sempre recaem sobre os cruzamentos de avenidas e ruas.
Cada residência visitada na pesquisa de origem e destino é igualmente assinalada com um ponto. Todas essas informações são digeridas por um computador, ao qual os técnicos propõem uma questão: em relação a cada ponto de origem e destino, qual a melhor linha de ônibus entre as alternativas existentes?
A questão proposta para o computador não é a criação da melhor linha, mas a seleção de uma melhor entre as opções disponiveis. Esse "melhor", para os técnicos, representa o que a população deseja, embora signifique quase sempre apenas a opção menos ruim entre as existentes.
Estabelecido o traçado da linha pioneira do Metrô, a Companhia já dispunha de algumas informações básicas: as linhas preferidas pelos usuários que estão na área de influência do trem e o fluxo diário de passageiros no conjunto de linhas de ônibus da região.
Agora entram novos dados nesse conjunto. Ao longo dos 16,9 quilômetros de extensão da linha Norte-Sul, há uma área de cerca de quatro quilômetros em cada margem que os técnicos consideram como de influência direta do Metrô. Entre Santana e o Jabaquara, a população da área de influência é estimada em 200 a 300 mil pessoas.
Porque há uma oscilação tão grande na estimativa? Os técnicos respondem que existem um componente humano que não pode ser previsto: muitas pessoas podem reagir ao Metrô.
Eles geralmente consideram a hipótese mais pessimista. Assim, dessa área de influência, 200 mil pessoas se utilizariam do Metrô e chegariam até as estações andando. Esse número é uma hipótese que ainda não foi checada na prática pelos estatísticos: "essas 200 mil pessoas devem chegar até as estações a pé porque moram relativamente próximo delas. Considerando que o Metrô diminui o tempo de viagem entre sua casa e seu trabalho, é bastante provável que elas prefiram passar a almoçar em casa. Neste caso, vão fazer quatro viagens por dia. Logo, 50 mil pessoas fazendo quatro viagens por dia somam 200 mil viagens. Basta que exista, na área de influência do Metrô entre Santana e Jabaquara, uma população de 50 mil pessoas que viva e trabalhe dentro dessa área. Como isto é muito provável, o número proposto é considerado plausivel".
Para que se chegue ao número médio de um milhão de passageiros, contudo, faltam mais de 800 mil pessoas. Os técnicos indicam que essas pessoas chegarão até as estações de três maneiras: através dos ônibus urbanos integrados (a maior parte), dos ônibus suburbanos (que trarão a população da região metropolitana: Guarulhos, Diadema e ABC).

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