TROÇAS DE ESTUDANTES PELA CIDADE
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Publicado
na Folha de S.Paulo, segunda-feira, 25 de janeiro de 1971
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Neste texto foi mantida a grafia original
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Todo começo de ano, a cidade vive um clima especial: é
epoca de vestibulares. Cerca de 50 mil estudantes movimentam-se na
tentativa de ingressar nas faculdades Atingida a meta, o preço
a pagar: o trote que os veteranos aplicam nos calouros. Mas a troça
estudantil não se limita aos muros das faculdades. De uma maneira
ou de outra, a população é chamada a participar.
Isso já constitui tradição em São Paulo.
Desde a fundação da primeira faculdade a Academia
de Direito do largo de São Francisco, as brincadeiras
dos estudantes ja eram famosas. Tratava-se no inicio, de pequenos
furtos de galinhas e perus dos quintais menos policiados, gaiatices
onde o atrativo não era o furto provavelmente dito, mas a emoção
da aventura.
Para planejar essas aventuras, os estudantes de então, tomavam
todas as cautelas, desde as informações colhidas de
vespera sobre o local, os perigos previstos, a espera na sombra noturna,
até a possibilidade de ataques de cães e mesmo de pancadas
e tiros.
Em certa ocasião, até o veado de ouro, emblema de uma
farmacia alemã da rua São Bento que existe até
hoje desapareceu misteriosamente, certamente obra dos estudantes.
O dono da farmácia conseguiu reconquistar o emblema , graças
a um anuncio assim: "Farmácia Veado de Ouro. O ilustrissimo
senhor ladrão, que levou do frontispício deste estabelecimento
o veado de ouro que servia de emblema, terá a bondade de vir
ou mandar restituir nesta casa, à rua São Bento. Garante-se
absoluto segredo e uma gratificação de 50 mil reis".
Uma das republicas casas habitadas só por estudantes,
a mais famosa em materia de troças, foi a chamada Comuna, da
rua Senador Feijó. Era um sobrado em cuja sacada da frente
os estudantes colocaram um manequim, cuja boca se comunicava por um
tubo com o interior da sala e dessa forma o boneco falava, cumprimentava
os passantes, mas vaiava os professores da Academia,
Um dos estudantes que se celebrizou pela gaiatice, costumava sair
muitas vezes à rua, depois da meia-noite, vestido de mulher
e armado de palmatoria, acompanhado de um crioulo que conduzia um
lampião aceso na cabeça. Cercava os transeuntes retardatarios
e lhes dava bolos nas mãos em nome da moralidade, dizendo-se
representante da opinião publica. Quando era preciso, o crioulo,
sujeito dos mais fortes, o ajudava.
Certas brincadeiras, porem punham em choque os academicos com autoridades
policiais, em incidentes que assumiam feições de certa
gravidade. Em 1843, durante uma representação no Teatro
de Opera, alguns estudantes começaram a tossir de tal forma
que o espetaculo não pode continuar. O presidente da Província,
que estava presente, orientou ao chefe de polícia que efetuasse
a prisão de um academico que se mostrava mais teimoso e insistente
que seus colegas. O conflito generalizou-se e terminou com a prisão
de diversos estudantes.
Num dia de festa religiosa na Igreja da Sé, os academicos entraram
em conflito com os policiais postados na porta. Os guardas tinham
missão de impedir que os estudantes assistissem à festa,
por temer alguma arruaça. Ao saberem disso, quase todos os
academicos tentaram entrar na Igreja. Um comentarista da época,
escreveu sobre o conflito: "Nunca se manifestou tanto fervor
religioso na classe academica". Até castiçais dos
altares da Sé foram usados como armas na luta que se travou.
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