A LONGA NOITE DE PÂNICO NO PORTO
|
Publicado
na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 21 de abril de 1977
|
|
|
Um incêndio no Terminal Marítimo Almirante Barroso, da
Petrobrás, em São Sebastião, provocado na madrugada
de ontem pela colisão do petroleiro "Cairu" com o
oleoduto do "pier" principal, levou a maioria dos habitantes
ao pânico, mas não houve vitimas na cidade. Um tripulante
caiu ao mar e não foi localizado até a noite de ontem.
O navio-tanque, carregado com 260 mil toneladas de óleo, realizava
manobras de atracação, ao chegar do Oriente Médio,
quando colidiu com o oleoduto. Embora não se tenham explicado
até a noite de ontem as causas do acidente, alguns técnicos
sugeriram a possibilidade de que uma faísca, no choque de ferros
contra ferros, tivesse iniciado o incêndio. Quanto ao choque
do petroleiro com o "pier", um funcionário apesar
do sigilo imposto a todos, revelou que o acidente se deveu ao rompimento
de um cabo de amarra.
O incêndio alcançou uma frente de cerca de 300 metros
com labaredas de dezenas de metros de altura, e só foi inteiramente
dominado depois das 11 horas da manhã de ontem.
Acordados por gritos de "fogo num navio de Petrobrás!",
os moradores do centro de São Sebastião deixaram suas
casas correndo à 1 hora da madrugada, carregando crianças
e sacolas, chegando a provocar congestionamentos nas saídas
em direção a Caraguatatuba e a Enseada, bairro considerado
mais seguro pela sua distância do terminal.
A Petrobrás distribuiu nota oficial, informando que "o
imprevisto não prejudicará o suprimento de petróleo
às refinarias da área de São Paulo, porquanto
os postos de atracação não afetados permitem
o abastecimento necessário".
Na tarde de ontem, mais calmos, os moradores comentavam o incêndio
e limpavam as calçadas enegrecidas pela fumaça.
|
Fogo
gera pânico em S. Sebastião |
Petroleiro colide com oleoduto e provoca incêndio de grandes
proporções
Dos enviados especiais
SÃO
SEBASTIÃO - Um incêndio no oleoduto do terminal
marítimo da Petrobrás, provocado na madrugada de ontem
pela colisão do navio-tanque "Cairu", da Força
Nacional de Petroleiros, contra as estruturas de proteção
do "pier" principal do terminal, levou a população
ao pânico, mas não houve vítimas na cidade.
Um tripulante do Cairu caiu ao mar e não foi localizado até
a noite de ontem.
Acordados por gritos de "fogo no navio da Petrobrás",
os moradores do centro de São Sebastião saíram
correndo pelas ruas carregando sacolas e crianças e chegaram
a congestionar todo o tráfego em direção a
Caraguatatuba e a Enseada, ponto da cidade considerado mais seguro
pela sua distância do terminal.
O incêndio, que começou por volta de uma hora da manhã
só foi contido perto das 11 horas, depois de formar uma frente
de mais de 300 metros de extensão, com labaredas que chegavam
a atingir dezenas metros de altura.
Durante todo o dia o assunto mais comentado pelos moradores de São
Sebastião era o incêndio no terminal da Petrobrás.
Mais calmos, os moradores procuravam limpar as calçadas enegrecidas
pela fumaça do incêndio. Até à noite
era grande o número de pessoas que procuravam o centro telefônico
da cidade para tranquilizar os familiares sobre a ocorrência.
Isto porque o fato já havia sido divulgado pela televisão
e começavam a chegar a cidade dezenas de pessoas procurando
saber se seus familiares haviam sido afetados pelo incêndio.
|
Pânico |
Era pouco mais de meia noite, quando começou o corre-corre.
Atraídos pelos gritos de "fogo no navio da Petrobrás"
vindos da rua, os frequentadores da Churrascaria Gaúcha deixaram
a casa em pânico. O "Show" foi interrompido e a casa
fechada.
Na praia, mais de 300 pessoas se aglomeravam para ver o fogo. "Quando
cheguei o fogo parecia estar ocorrendo no navio e já ocupava
50 por cento do seu comprimento. Fui em casa buscar um binóculo
e, quando voltei, as chamas haviam se estendido num raio de 300 metros,
mas o navio já fora retirado", declarou um espectador.
A cidade foi invadida por uma fumaça negra, e a chuva que caía
na ocasião, também era preta. Até ontem os carros
e casas de São Sebastião estavam manchados de fumaça
e água escura da chuva.
Segundo outro morador da cidade - o motorista Sebastião Salomão
de Oliveira - "o trânsito ficou tumultuado. Não
havia mão nem contramão, os carros tentavam furar o
congestionamento subindo nas calçadas e aumentando o caos.
Todos queriam fugir, com medo que a cidade fosse pelos ares."
|
Prefeito |
O prefeito de São Sebastião, coronel Gentil Antunes
Correa, foi acordado pelos vizinhos. Imediatamente, rumou para o Pier
Sul, onde ocorria o incêndio, e ficou sabendo pelos encarregados
da segurança do terminal que "tudo estava sob controle".
Passava de uma hora quando o alerta ao Copom e Corpos de Bombeiros
de cidades vizinhas foi suspenso e o superintendente do terminal comunicou
que estava sendo feito o resfriamento dos tubos condutores de óleo.
Segundo o prefeito, "não houve pânico na cidade,
apenas alguns moradores, por precaução, tiraram suas
famílias do centro, temendo intoxicação pela
fumaça".
Ele informou que a Polícia Militar montou um dispositivo de
segurança em frente ao terminal, para impedir o acesso de curiosos
e evitar aglomerações. As três da manhã
ele comunicou a ocorrência, por telegrama, ao governador Paulo
Egídio e ao comandante da 12a Brigada de Infantaria, general
Fernando Cerqueira Lima, em Capaçava.
De acordo com o prefeito foi o primeiro incêndio que ocorreu
no terminal. Há dois meses, houve vazamento de óleo
nos tanques de um petroleiro, sujando as praias. Desta vez, ele acredita
que não haverá poluição, pois o óleo
derramado foi todo queimado.
|
Faísca
teria sido a causa |
Segundo alguns técnicos da Petrobrás, a colisão
do navio contra o oleoduto causou um rompimento de cerca de 30 metros
de extensão na rede, provocando um vazamento de grande quantidade
de óleo bruto.
"Com o impacto, ferro contra ferro, é possível
que tenha havido uma faísca, que provocou o incêndio",
informou o delegado da Capitania dos Portos, Francisco José
de Oliveira Lima. Segundo ele, o "Cairu" transportava
260 ml toneladas de óleo, mas o fogo não chegou a
atingir o barco, que foi imediatamente removido do porto por ordem
da Capitania. Também os navios que estavam atracados no Cais
Comercial e no Pier Sul receberam ordens para desatracar imediatamente.
A Capitania dos Portos colocou em alerta os hospitais, bombeiros
de municípios vizinhos, além de pedir reforços
ao Copom em São Paulo. Mas não foi necessário
empregar todo esse efetivo, pois os encarregados da segurança
do terminal conseguiram controlar o fogo. A Capitania dos Portos
abriu inquérito para apurar as causas do acidente, mas, segundo
o delegado, o inquérito é sigiloso.
|
Causas
ignoradas |
Tanto a Capitania dos Portos como a Superintendência do Terminal
desconhecem as causas do acidente. Segundo o delegado da Capitania
dos Portos além da sinalização de rotina do porto,
o processo de atracação dos petroleiros é controlador
por um radar que aponta a aproximação do navio em metros
por segundo e sua velocidade. Todos os navios são atracados
e desatracados com práticos treinados e conhecedores da baía.
Também os encarregados do terminal são especializados.
Por isso, até ontem, ninguém conseguia explicar o que
falhou na atracação do "Cairu".
Não obstante o sigilo dos funcionários da Petrobrás,
um deles, que preferiu não se identificar, chegou a comentar
que o acidente teve origem em virtude do rompimento do cabo de amarra,
com o que o navio se desgovernou e acabou por colidir contra o "pier".
Além do atrito causado pelo choque, fios de eletricidade cairam
sobre as tubulações, dando origem ao incêndio.
O mesmo funcionário informou que a pôpa do navio NT-Cairu
chegou a ser atingida pelas chamas, mas que a pronta intervenção
dos tripulantes foi eficiente e o fogo debelado, tendo a embarcação
sido retirada para local mais distante, como também outros
dois navios que se encontravam ancorados no "pier" norte
zarparam rapidamente.
|
O
pretoleiro |
O "Cairu" é um dos maiores barcos da Frota Nacional
de Petroleiros (Fronape) e chegava ontem a São Sebastião
procedente do Oriente Médio, carregado com sua capacidade completa
de 260 mil toneladas.
Segundo a Capitania dos Portos e a Superintendência do Terminal,
o navio não sofreu danos e não houve vitimas a bordo.
Mas um tripulante caiu ao mar e não foi localizado até
a noite. De acordo com o capitão Lima, esse tipo de barco geralmente
possui uma tripulação de 35 a 40 pessoas. No entanto,
até o final da tarde de ontem, o comandante do navio ainda
não comunicara oficialmente o acidente à Capitania.
Por isso o delegado desconhecia a situação da tripulação
e do barco, que estaria sendo levantada pelo comando do "Cairu".
1a. Nota Oficial
O superintendente do Terminal Marítimo Almirante Barroso, da
Petrobrás, eng. Luiz Massaia, expediu ontem uma breve nota
oficial:
"O Superintendente do Terminal Marítimo Almirante Barroso
comunica que, por volta de 1h00 de 20/4/1977 o navio-tanque "Cairu"
colidiu com o "Dolfin n. 2" do Pier Sul, ocasionando um
incêndio nas linhas de produto. Não houve vitimas e também
o navio não sofreu avarias. Fazendo levantamento danos causados
terminal".
Todos os repórteres que buscavam explicações
para o acidente na Superintendência do Terminal eram recebidos
pelo tenente Jorge Luiz C. Fernandes, chefe da segurança interna,
que limitou-se a declarar: "Negativo. Está aí a
nota oficial. Nada mais há a declarar, por motivos de segurança.
Maiores informações no Serviço de Relações
Públicas, no Rio de Janeiro".
A superintendência não sabia informar sobre os danos
causados no terminal, os prejuízos financeiros e por quanto
tempo o Pier Sul ficará paralisado. Garantia apenas que o abastecimento
de óleo do País não será afetado.
|
Oito
anos sem a defesa civil |
Dos cerca de 25 mil habitantes de São Sebastião, aproximadamente
12 mil estão concentrados num núcleo entre os bairros
de São Francisco e Topolândia, a área mais proxima
do terminal - e embora a Petrobrás esteja instalada na cidade
há oito anos, não existe, até agora, nenhum esquema
de segurança para proteger a população em casos
de catástrofes, como algum sistema de evacuação
da cidade em casos de emergência.
Não existe nenhum carro do Corpo de Bombeiros no Município
que depende dos serviços da Unidade de São José
dos Campos. Segundo o prefeito, a cidade é extremamente carente,
não possui rede de esgotos e apenas 30 por cento do seu minguado
orçamento são destinados a obras de manutenção.
Este ano, o orçamento da Prefeitura atingiu Cr$ 17.545 mil.
Isto não permite a criação de uma infra-estrutura
mínima para a população que, em época
de veraneio, chega a 100 mil pessoas. Do orçamento da Prefeitura,
50 por cento são destinados à folha de pagamento, 20
por cento à educação e 30 por cento para obras
e manutenção.
O fato de a população ter ficado oito anos sem proteção
adequada para os riscos remotos, mas possíveis, trazidos pelo
terminal, não abala o prefeito. Segundo ele, é impossível
criar um esquema de defesa civil em oito anos.
Atualmente, há um projeto com esse objetivo, visando a construção
de uma Unidade de Segurança Integrada, onde seriam concentrados
recursos do Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Polícia
Florestal, equipes de salvamento etc. mas só dentro de três
ou quatro anos isso será uma realidade, diz o prefeito.
|
Terminal |
O prefeito de São Sebastião acha que a implantação
do terminal da Petrobrás trouxe muitos benefícios
à cidade. Entusiasmado, ele aponta a criação
de 403 novos empregos (dos quais grande parte foi preenchida por
pessoal de fora da cidade) e a satisfação do Município
por servir patrioticamente o País.
Fora isso, a Petrobrás contribui com imposto territorial
que neste ano chegou a Cr$ 400 mil impostos predial.
Em troca o Terminal é responsável pelo recebimento
de 80 por cento do petróleo consumido no País. Mas
como o óleo é refinado em Capuava, Cubatão
e Paulínea, quem se beneficia da tributação
sobre produto são os municípios-sedes dessas refinarias.
A escolha de São Sebastião para abrigar o maior Terminal
Marítimo do País se deveu ao fato de ser o terceiro
posto do mundo. Ele pode receber navios de até 400 mil toneladas
e, com melhorias, de até 800 mil toneladas, com a vantagem
de não precisar de dragagem.
|
Análises
levantam condição da praia |
Tão logo tomou conhecimento do acidente com o petroleiro, no
Porto de São Sebastião, o secretário Francisco
de Barros, de Obras e do Meio Ambiente determinou que uma equipe especial
de técnicos da CETESB fosse para a área fazer uma análise
de emergência nas águas das praias locais.
A CETESB faz análises de rotina, semanais, em todas as praias
do Litoral Norte, entre elas as de São Sebastião. Mas
como no acidente com o navio uma grande quantidade de petróleo
caiu no mar, foi necessário mandar fazer um levantamento de
emergência, cujos resultados, no entanto, só estarão
prontos amanhã. Recomenda-se, enquanto isso, que os banhistas
evitem usar as praias próximas ao local, como medida de segurança.
|
©
Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos
reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em
qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização
escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.
|
|