COLLOR REAGE NA RETA FINAL DA ELEIÇÃO E DESPONTA COMO O PRESIDENTE ELEITO


Publicado na Folha de S. Paulo, segunda-feira, 18 de dezembro de 1989


O candidato do PRN, Fernando Collor de Mello, 40, é o virtual presidente da República, indica a pesquisa de boca-de-urna do DataFolha. Ontem à noite, o irmão do candidato, Leopoldo, disse à Folha que Collor quer fazer "um governo social-democrata e de entendimento nacional". Pela manhã, em Maceió, Alagoas, o eleito afirmou que "o resultado será muito melhor do que pensávamos".
À noite, dirigentes da campanha do candidato do PT, Luis Inacio Lula da Silva, 44, ainda manifestavam esperança de vitória. Pela manhã, na casa de Lula, em São Bernardo (Grande São Paulo), o ambiente não era de entusiasmo. O candidato, depois de votar, embarcou, às 12h40, no helicóptero prefixo PT-HFO sem divulgar para onde ia. Antes, disse que "numa eleição, você tem que estar preparado para a vitória e para a derrota". Collor aguarda o resultado na sua casa, em Brasília, onde chegou às 11h30.
A eleição foi tranquila em todo o país. Choveu no interior da Bahia e de Minas Gerais, o que provocou aumento das abstenções em prejuízo de Collor. As pesquisas mostram que ele tem mais eleitores no interior. No Rio Grande do Sul a abstenção também cresceu, prejudicando Lula, o mais votado no Estado.
Faltou transporte público na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, e em Salvador, Bahia. O PT responsabilizou o adversário pelo problema. Lula é o mais votado no Rio e estava à frente em Salvador.
Os dois candidatos fizeram 20 dias de campanha para o segundo turno. Nesse período, Collor somou 40.751 km em viagens; Lula deslocou-se por 27.951 km. Rosane, 24, virtual primeira-dama, esteve ao lado do marido em quase todos os atos da campanha; o mesmo fez Marisa, 39, mulher de Lula.
Collor entrou na disputa do segundo turno com amplo favoritismo. Na campanha perdeu intenções de voto, enquanto Lula subia, segundo todas as pesquisas. Depois da realização do segundo debate entre os candidatos, quinta-feira, o DataFolha constatou que a queda de Collor estancou, ao passo que Lula sofria a primeira queda na preferência dos eleitores.
O ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega, apelou ao eleito para indicar logo a equipe de governo a fim de tranquilizar o mercado financeiro.

Vitória de Collor abre espaço para guerra sindical

Eleonora de Lucena
Editora de Economia


A Central única dos Trabalhadores vai ser um dos principais problemas do provável eleito, Fernando Collor de Mello. Braço sindical do PT, a CUT deve fazer oposição sistemática ao novo governo. Fortalecida com a votação do partido, a CUT vai tentar se consolidar com a mais forte vertente de oposição no país. Se Collor não conseguir neutralizar ou isolar, a ação da central, o primeiro de maio de 90 pode ser marcado por muitas greves e protestos.
Collor tem do seu lado Antônio Rogério Magri, que lidera uma facção da CGT. Mas a força efetiva de Magri é pequena se comparada à CUT, que está mais enraizada no movimento sindical e tem forte presença nacional. Por isso, a estratégia do virtual eleito deve ser a de buscar o apoio de Luiz Antônio de Medeiros, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. Medeiros se manteve distante das duas candidaturas e, agora, pode ser um dos principais personagens da articulação política que se inicia hoje.
Nesse terreno, Collor pode ter começado somando pontos. Medeiros declarou ontem que o movimento sindical deve dar um voto de confiança ao eleito. Rival da CUT, ele também tem interesse em esvaziar a força da central sindical ligada ao PT.
Isolado o efeito do movimento sindical, o desafio de Collor para conter as greves será a própria política salarial. Passada a festa das bandeiras e buzinadas, a inflação continuará em alta e as demandas sociais - e por salário - devem aumentar. Afinal, a população assalariada espera mudanças. O máximo anunciado pela equipe de Collor foi que os salários devem ser "negociados" em câmaras envolvendo trabalhadores, empresários e governo - a mesma proposta de Lula.
Estratégia idêntica o provável eleito pretende aplicar à política de preços. Tudo é considerado como sendo uma "desindexação negociada" da economia. No fundo, Collor deve querer reeditar a idéia de "pacto social" - a saída para neutralizar a forte oposição que terá com uma vitória tão apertada.
A costura política de seu Ministério deve expressar essa estratégia. Empresários, sindicalistas, políticos esperam que o eleito sinalize melhor o perfil de seu governo. Passada a fase de campanha, o jogo recomeça. Nesse sentido, a indicação do novo ministro da Fazenda (ou da Economia, como quer Collor) é uma das peças mais importantes do quebra-cabeças.
Alguns apostam que a hiperinflação chegará antes da posse. O certo é que a inflação deve estar muito alta, acima dos 50% previstos para este mês (e que os manuais de economia classificam como hiperinflação). A equipe de Collor tem afastado a tese do congelamento de preços, sob o argumento de que ela está muito identificada com o governo Sarney. De qualquer forma, muitos empresários já trabalham com a hipótese de um congelamento ou tabelamento.
Na posse, é certo que o país estará no meio de uma crise de abastecimento de álcool e em moratória da dívida externa para os credores privados. A dívida interna, por conta das altas taxas de juros pagas pelo atual governo, terá aumentado ainda mais. As tarifas públicas estarão defasadas e a nova administração terá que anunciar reajustes de preços. Há ainda o problema cambial: os exportadores reclamam de defasagem e pedem uma maxidesvalorização do cruzado novo. Alguns técnicos de Collor gostariam que Mailson resolvesse pelo menos esse problema, para evitar mais desgastes futuros.
No terreno dos confrontos, o Congresso deve ter lugar de destaque. É provável, que nos próximos dias, além da articulação sindical, comece a conversa do eleito com os parlamentares mais influentes. Aí, também, a estratégia do "pacto social" deve ganhar força.
Collor pretende, logo no primeiro dia de governo, anunciar planos de reforma administrativa, uma lei de privatizações e outra para o funcionalismo. Quer acenar com mudanças no Imposto Territorial Rural (ITR) e criar varas específicas para tratar de assuntos ligados à sonegação. Todos esses pacotes vão precisar do apoio do Congresso. Também passará pelos parlamentares a renegociação da dívida externa.
Nesse ponto, a virtual vitória de Collor deve repercutir positivamente entre os credores. No curto prazo, o resultado da eleição deve acalmar a especulação no mercado financeiro. No longo prazo, os técnicos ligados ao PRN acham que se 90 fechar com um crescimento do PIB igual ao de 89 (3%) terá sido uma grande vitória. Sinal de que uma recessão pode vir por aí.


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